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Covid-19 continua a avançar em comunidades e mata dois índios por dia

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Quase seis meses após a chegada do novo coronavírus ao Brasil, a Covid-19 segue se espalhando pelas comunidades indígenas e provocando mortes. A cada dia, dois índios morrem em decorrência da doença nas aldeias.

Mesmo com a gravidade, o governo ainda está na fase de discussão de projetos para proteger a população indígena, apesar de decisões que o obrigam, proferidas pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Dados da Sesai (Secretaria de Saúde Indígena) apontam 352 mortes de índios em decorrência da Covid-19 nas aldeias e um total de 21.064 casos confirmados da doença, até sexta-feira (21). A cada hora, cinco indígenas são contaminados.

Os números, no entanto, podem ser maiores. De acordo com balanço da Apib (Articulação dos Povos Indígenas), foram 700 os índios que perderam a vida pela Covid-19 e há um total de 26.615 contaminados.

No extremo sul baianno, dois morreram em Coroa Vermelha, maior aldeia urbana do país, que fica em Santa Cruz Cabrália, extremo sul da Bahia, 58 índios já tiveram Covid-19, mas desses, 31 estão curados.

Os dados são discrepantes porque a Sesai contabiliza apenas os indígenas que vivem em comunidades. O órgão não soma aqueles que são de cidades ou de áreas não demarcadas.

Considerando os dados da Apib, a mortalidade por 1 milhão de habitantes dos indígenas é maior do que a registrada no Brasil como um todo. O índice brasileiro é de 510, enquanto o dos indígenas, de 855.

Ana Lúcia Pontes, pesquisadora da Fiocruz e coordenadora do grupo de trabalho de saúde indígena da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, destaca que a Covid-19 se torna mais preocupante nas aldeias porque os indígenas são grupos de múltiplas vulnerabilidades.

Ela explica que eles têm dificuldade de acessar as políticas públicas, o serviço de saúde é precário e não existe assistência médica para remoções de doentes. Com isso, já chegam às cidades com casos mais graves.

“É uma população que também sempre teve seu território ameaçado, está cada vez mais confinada”, diz Pontes.

Jordeanes Araujo, coordenador do Neabi (Núcleo de Estudos e Pesquisas Afrobrasileiros e Indígenas) e professor da Universidade Federal do Amazonas, acrescenta que a testagem para a Covid-19 é insuficiente.

“É necessário testar mais para entender quantos contaminados e direcionar política de confinamento para as pessoas que estão com a doença, os índios são pessoas que ficam mais aglomeradas, dormem num local com mais de dez pessoas”, disse.

Além da situação de vulnerabilidade, líderes indígenas apontam a falta de ações do governo federal.

“Não estamos sentindo essas medidas chegarem às comunidades. A gente está na fase ainda de discussão do plano”, afirma Luiz Henrique Eloy Terena, representante da Apib.

Reportagem do jornal Folha de S.Paulo publicada no fim de julho mostrou que o governo federal admitia que não existiam barreiras sanitárias contra a Covid-19 em oito terras indígenas com povos isolados –ainda mais vulneráveis.

A Apib considerava que o número poderia ser maior, 31, porque a gestão de Jair Bolsonaro considerava como barreira sanitária todas as Bapes (Bases de Proteção Etnoambientais), mesmo que elas não dispusessem de mecanismos para evitar contágio –como testes de Covid e equipamentos de proteção.

Passado quase um mês, a situação pouco avançou. O governo federal, cumprindo decisão do STF, apresentou uma segunda versão do plano, no qual apresenta três prioridades, sendo a principal estabelecer barreiras sanitárias onde não há nenhum tipo de obstáculo.

Em manifestação entregue nesta sexta, a Apib questiona as prioridades do governo, alegando que as ações mais urgentes deveriam levar em conta as comunidades mais vulneráveis.

Em uma outra frente, existe um grupo de trabalho com ministérios e entidades representativas dos índios. Novamente, o projeto do governo foi criticado pelas associações.

Os principais motivos são que ele contempla 163 das 537 terras indígenas e apresenta apenas ações executadas, e não um planejamento futuro. Por causa disso, o ministro Luís Roberto Barroso determinou nesta sexta que o governo apresente um novo plano até o dia 7 de setembro.

Nas comunidades, indígenas reclamam da pouca assistência da Sesai. Dizem ainda que muitos profissionais de saúde acabaram levando o vírus para as aldeias.

Cleiton Ramos Macedo é representante da etnia jiahui, do sul do Amazonas. Ele conta que a Covid-19 chegou no fim de maio à aldeia e os que foram diagnosticados acabaram tratados com remédios tradicionais.

“A situação é preocupante com os anciões, há muitas pessoas do grupo de risco. A remoção é difícil, o município de Humaitá fica a 106 quilômetros, sendo necessário pegar uma balsa e, até chegar no hospital, já houve mais complicações”, disse.

A Sesai, em nota, rebateu acusações de falta de estrutura. Segundo o órgão, o número de técnicos dos últimos anos (15.038) foi mantido e ainda contratados 219 novos funcionários.

A secretaria afirmou que repassou 67.220 testes para os distritos sanitários indígenas e que essas próprias unidades adquiriram outras 70 mil unidades.

Sobre a afirmação de lideranças de que técnicos da Sesai haviam contaminado indígenas, o órgão afirmou que os profissionais infectados foram afastados do trabalho.

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disse que o governo tem implementado políticas para proteção. No dia 13 de abril, a pasta anunciou o Plano de Contingência para Povos Indígenas.

O ministério afirmou ainda que nem todas as comunidades indígenas necessitam de algum tipo de barreira sanitária. Segundo a pasta, o Ibama, com o apoio da Polícia Federal, do Ministério da Defesa e da Funai, tem atuado de forma intensa no combate a atividades ilegais.

A Funai (Fundação Nacional do Índio) não se manifestou.

Fonte: Bahia Notícias

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