Estados Unidos e Rússia: onde estão os heróis?
Os estadunidenses e os membros da Otan não entendem porque a Rússia os encara com uma ameaça, mas é preciso lembrar que a Otan é um grupo militar, não um bloco amigável.
Pesa contra Moscou a retórica de ser um eterno vilão. Nos jornais e nos filmes, na ficção e na realidade, os vilões são quase sempre os mesmos – aqueles que se opõem ou se opuseram, em algum momento da história, aos Estados Unidos. Os russos são sempre apresentados com um estereótipo frio e maquiavélico, e isso já faz parte do imaginário ocidental, que fatalmente impacta a percepção da nossa realidade. Quando foi a última vez que você leu algo positivo sobre a Rússia na mídia ocidental? Tudo relativo à Rússia é ruim, mau e vexaminoso – o país se tornou o bode expiatório para tudo que há de ruim.
O enredo fica ainda mais conturbado diante da falta de credibilidade da outra parte. Os Estados Unidos têm um histórico preocupante de usar informações falsas, utilizadas para justificar invasões, guerras e mortes.
Todo mundo, até mesmo os estadunidenses, sabe que a Guerra do Iraque, em 2003, foi baseada em uma inteligência falsa.
Esse mesmo sentimento que você tem de revolta contra a “invasão” russa à Ucrânia, você teve quando os Estados Unidos invadiu o Vietnã, o Iraque (na segunda vez), o Afeganistão etc?
O Estado Islâmico, grupo terrorista, surgiu nos porões das prisões do Iraque quando o país estava sob controle dos Estados Unidos.
Alguém sentiu a mesma revolta quando os Estados Unidos abandonou o Iraque e, agora, mais recente, o Afeganistão, entregando o território nas mãos de grupos extremistas?
Até hoje, o único país a utilizar bombas atômicas em guerra foi o Estados Unidos.
Quantas ditaduras os Estados Unidos financiou ao longo do último século na América Latina?
A invasão russa à Ucrânia ou a terceira guerra mundial como já se vende esse conflito pelo Ocidente, ocorreu nessa manhã, 24 de fevereiro.
Putin foi à TV para dizer que faria uma “operação militar especial” no Donbass, a área de maioria russa étnica no leste do vizinho. Seu comando militar, contudo, confirmou que “armas de precisão estão degradando a infraestrutura militar, bases aéreas e aviação das Forças Armadas ucranianas”.
Putin disse estar cumprindo o que havia prometido: enviar tropas para apoiar as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk, e negou que irá ocupar a região do vizinho na qual ele reconheceu áreas rebeldes pró-Rússia. Ele disse que quer trazer à justiça quem cometeu o que chamou de “genocídio” e “crimes” contra russos nas áreas, além de “desmilitarizar e desnazificar” a Ucrânia. Lembrando que os Estados Unidos vem financiando grupos neonazistas na Ucrânia há tempos, no sentido de isolar regiões da Rússia.
Há sinais claros de um ataque amplo de Putin, mas não se sabe se é uma invasão total nos termos colocados por Kiev, capital da Ucrânia, e pelo Ocidente.
A Rede Globo começou sua transmissão hoje, utilizando a retórica ocidental, condenando o ato, com opiniões alarmistas de todo o mundo. Seu comentarista Jorge Pontual chegou a dizer que Putin vai se isolar ao resto do mundo, chegando ao disparate, ao menosprezar o apoio da China (uma das três maiores potências econômicas do mundo) que a Rússia possui.
A Otan vírgula os Estados Unidos, prepara uma série de sanções contra a Rússia, mas ela é a principal fornecedora de gás para União Europeia, entre outros produtos, que se para os Estados Unidos não são tão importantes, para os países europeus, como a Alemanha, dependente do gasoduto russo, são fundamentais. Além disso, a Rússia é o principal destino das exportações alemãs. Não faz sentido nenhum para Alemanha embarcar nessa narrativa das sanções da Otan.
Prepare-se para um arsenal midiático no Brasil, da retórica estadunidense ocidental, onde o herói é mais vilão do que o vilão.
* Com informações da Folha de São Paulo e Brasil de Fato.