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Máscaras de Saubara: as mulheres escondidas que libertaram a Bahia

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No recôncavo da Bahia, há uma tradição tão misteriosa quanto poderosa: as Máscaras de Saubara. Quem as vê desfilando nas ruas, com seus rostos cobertos por caretas monstruosas, dificilmente imagina a profundidade histórica e o protagonismo revolucionário dessas mulheres durante um dos capítulos mais decisivos da história nacional: a guerra pela Independência da Bahia, celebrada em 2 de julho de 1823.

O Que São as Máscaras de Saubara?

As Máscaras de Saubara são, originalmente, caretas artesanais produzidas em papel machê, tecido, palha, chifres e fibras, com formas grotescas ou animalescas — olhos esbugalhados, bocas ameaçadoras, dentes afiados, chifres, e feições inspiradas no folclore afro-indígena. Elas fazem parte do repertório festivo do Recôncavo, especialmente em Saubara, mas sua origem remonta ao período das lutas pela independência baiana.

Por trás de cada máscara, uma mulher real: negra, parda, indígena, vaidosa, bela, cheia de força e identidade. A máscara escondia o rosto, protegendo a identidade dessas mulheres, mas também permitia que sua coragem ganhasse novas formas de expressão.

Estratégia de Guerra e Atitude de Resistência

Durante as batalhas do 2 de Julho, quando a Bahia ainda era o principal bastião português no Brasil, as mulheres de Saubara assumiram um papel fundamental e audacioso. Sabendo que poderiam ser presas ou mortas caso fossem identificadas, as baianas passaram a usar máscaras para se disfarçar e circular entre acampamentos de soldados brasileiros e portugueses.

Mas não era só camuflagem:

* Sedução estratégica: Muitas dessas mulheres, belas e sensuais, usavam o disfarce para se aproximar dos soldados portugueses, oferecendo descanso, conversas e até relações, minando o moral do inimigo e arrancando segredos militares.

* Espionagem e sabotagem: O anonimato permitia atuar como espiãs, escutando planos, transmitindo recados para os patriotas, ou mesmo sabotar provisões e armamentos dos invasores.

* Renovação dos combatentes brasileiros: Ao mesmo tempo, davam suporte físico e emocional aos lutadores baianos, ajudando a manter acesa a chama da resistência.

Essas ações — que misturavam astúcia, ousadia e um profundo senso de comunidade — foram essenciais para a vitória dos baianos e a expulsão definitiva dos portugueses. As Máscaras de Saubara, assim, transformaram a feminilidade em arma política e cultural.

Mais Que Folclore: Patrimônio de Luta

Com o tempo, a tradição se perpetuou. O que nasceu como artifício de guerra se transformou em manifestação cultural: as Caretas de Saubara (como também são chamadas) passaram a desfilar em festas populares, carnaval e celebrações do 2 de Julho, sempre carregando o simbolismo do mistério, do anonimato, da força feminina e da resistência.

Hoje, as máscaras são feitas em ateliês familiares, passadas de geração em geração. Representam não apenas um folguedo popular, mas a memória viva de uma estratégia coletiva, capaz de unir sensualidade, inteligência, coragem e pertencimento. Ao desfilarem, essas mulheres reafirmam sua história e sua importância no processo de independência da Bahia — e, por extensão, do Brasil.

Mulheres Invisibilizadas, História Redescoberta

A história oficial pouco falava sobre essas mulheres. Só recentemente pesquisadores e movimentos culturais passaram a valorizar o papel das mulheres mascaradas de Saubara como personagens centrais da luta pela liberdade. Sua história inspira não só a Bahia, mas todo o Brasil, ao mostrar que a independência não foi feita apenas por generais e políticos, mas também — e principalmente — pelo povo, pelas mulheres, pelos anônimos que usaram da inteligência, da beleza e do mistério para mudar os rumos da nação.

O Legado Atual

Ver uma mulher mascarada nas ruas de Saubara é, ainda hoje, ver uma herdeira direta daquelas guerreiras do século XIX. É lembrar que, muitas vezes, o que está escondido por trás de um rosto é justamente o que constrói a história de um povo.

Viva as Máscaras de Saubara! Viva as mulheres que libertaram a Bahia! Viva o 2 de Julho, a verdadeira independência do Brasil!

** Texto do Jornalista e Presidente do CDL de Porto Seguro, Vinícius Brandão

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