Na tarde desta terça-feira (9/12), o deputado federal Glauber Braga (PSOL–RJ) protagonizou um ato de protesto intenso ao se sentar na cadeira destinada ao presidente da Câmara dos Deputados — hoje ocupada oficialmente por Hugo Motta (Republicanos–PB).
Glauber justificou o gesto como reação ao anúncio de que seu processo de cassação, aprovado pelo conselho de ética, será levado a plenário na quarta-feira (10/12), e criticou o que chama de “perseguição política”. Ele afirmou: “Eu vou me manter aqui firme até o final dessa história” e “aqui ficarei até o limite das minhas forças”.
Contexto da cassação
O processo que motiva o protesto foi aprovado pela comissão de ética da Câmara. Braga é acusado de quebra de decoro parlamentar após ter empurrado e chutado, em 2024, um integrante de um movimento político durante sessão no Congresso.
O presidente da Casa, Hugo Motta, havia anunciado que o plenário da Câmara votará os pedidos de cassação de Braga, Zambelli e Bolsonaro, a partir desta quarta-feira (10/12).
Pouco após a ocupação simbólica da Mesa Diretora, a segurança da Câmara — Polícia Legislativa — foi acionada. Policiais pediram que Braga deixasse a cadeira; diante da recusa, decidiram retirá-lo à força, provocando tumulto.
Para impedir o registro do ocorrido, jornalistas e assessores foram expulsos do plenário, e o sinal de transmissão institucional — da TV Câmara — foi cortado. Com isso, a sessão foi interrompida e os parlamentares remanescentes ficaram isolados no plenário.
Por que muitos falam em “moeda de troca” — mesmo sendo adversários políticos?
A pauta de cassação conjunta une parlamentares de espectros opostos: Braga (esquerda, PSOL) e Zambelli (direita, PL) e Eduardo Bolsonaro (direita, PL). A proximidade no cronograma levanta hipótese de que a Mesa da Câmara — e quem a controla — busca dar aparência de “equilíbrio” para uma decisão que, na prática, pode favorecer interesses específicos.
A decisão de pautar ambas ao mesmo tempo acontece no mesmo dia em que está marcada a votação do PL da Dosimetria, que reduz penas de condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 — incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Ou seja: ao mesmo tempo que se julga cassações — inclusive de alguém do centro-direita ligado ao bolsonarismo —, abre-se possibilidade de “alívio penal” para condenados pelo 8 de Janeiro, movimento visto como desmanche de condenações contra golpistas. Uma espécie de “dar com uma mão, tirar com a outra”.
Para muitos analistas e opositores da manobra, esse agendamento simultâneo converte a cassação de Braga (algo questionado por parte da esquerda como arbitrário) e a de Zambelli e Eduardo (direita) numa espécie de “barganha institucional disfarçada de processo legítimo”.
Em coletiva após ser retirado, Braga denunciou uma “ação violenta” e criticou a gestão da Mesa: “Com os golpistas, sobrou docilidade. Com quem não entra no jogo deles, é porrada”, disse.
Clima político e judicial: tensão elevada
O ambiente está altamente polarizado desde a prisão de Jair Bolsonaro (condenado a longa pena pelo STF). A proposta de redução de penas via PL da Dosimetria é vista como um aceno da base conservadora e bolsonarista para reverter decisões judiciais.
A aprovação do PL da Dosimetria seria interpretada por muitos como enfraquecimento da responsabilização dos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro — o que provoca forte rejeição de parlamentares e setores que defendem a preservação do Estado Democrático de Direito.
Nesse contexto, a cassação de um deputado de esquerda (Braga) e dos bolsonaristas (Zambelli e Eduardo) pode ser usada como instrumento de “equilíbrio” para dar legitimidade ao processo — mesmo sendo casos de naturezas distintas. Isso alimenta a narrativa de “dois pesos e duas medidas” no Congresso, amplificando críticas institucionais.
O que pode estar em jogo — e os riscos para a democracia e o Parlamento
Se os mandatos caírem, o efeito simbólico será grande — reforçaria a ideia de que cassações podem servir como instrumentos políticos, e não necessariamente como consequência de faltas graves. Isso pode fragilizar a imagem da Câmara como instituição imparcial e disciplinada.
A aprovação do PL da Dosimetria, junto com cassações seletivas, pode gerar um “arranjo de poder” capaz de reconstruir parte dos grupos condenados, alterando o equilíbrio político no Legislativo. Para críticos, isso representaria retrocesso institucional.
Por outro lado, defensores da cassação de Braga apontam a necessidade de rigor para condutas violentas; no caso de Zambelli, há quem defenda a rejeição da cassação alegando incertezas processuais, já no caso de Eduardo Bolsonaro, há quase um consenso de que o deputado presta um desserviço para o país, atuando no exterior e a ausência nas sessões é determinante para a sua cassação — o julgamento no Plenário pode sinalizar os critérios que valem para “decoro vs. crimes graves” no Congresso.
Um momento de inflexão com consequências para o futuro
A combinação de cassação de diferentes espectros políticos com votação de redução de penas para condenados por golpe configura um momento-chave para o que será considerado “normal” no parlamento brasileiro.
Mais do que apenas punir ou absolver — trata-se de definir se o Legislativo se pauta pelo rigor institucional, ou pela conveniência política-partidária.